Nicolly Oliveira, de 13 anos, foi uma das primeiras
alunas a chegar à escola Novo Ângulo Novo Esquema (Nane), em São Paulo, no
último sábado (24), por volta das 19h. Lucas Scandurra, de 21 anos, estava
animado para escutar as músicas do Charlie Brown Jr, e também para paquerar.
Já, Maria Eduarda de Carvalho, a Duda, de 15 anos, queria aproveitar para se
divertir com seus amigos e colegas de classe.
Os três jovens foram para a escola à noite para
participar de mais uma balada promovida pela Nane. A escola oferece ensino
regular para crianças e jovens que têm dificuldades de aprendizagem e
deficiência intelectual, como autismo, síndrome de Down e Asperger, deficiência
física ou outro tipo de necessidade especial.
As festas começaram a ser realizadas neste ano para
promover a sociabilização dos alunos, já que muitos jovens precisam do apoio
dos pais para sair e encontrar os amigos, e também para apresentar uma balada
real para os jovens. "Lidar com a diferença é a única maneira de se
praticar uma educação em que todos têm direito de aprender e crescer com
autonomia e independência", diz a escola em seu site.
"A balada é o momento da paquera, dos amigos, da
música e da sociabilização. Ele gosta e curte como qualquer pessoa", diz o
músico Edgard Scandurra, pai do Lucas e ex-guitarrista da banda Ira!. "A
função da escola é preparar esses meninos e meninas para uma vida social e essa
iniciativa é muito boa. Cabe a nós, os pais, a dar sequência a isso."
Lucas participou de todas as baladas promovidas pela
escola e apesar de já ter ido em algumas festas com seu irmão mais velho, ele
ainda prefere os encontros organizados pela Nane. "Aqui as músicas são
mais legais e ainda tem a paquera", ressalta.
Há quatro anos na Nane, Lucas ficou dois anos no módulo
de desenvolvimento e está no 2º ano do OPTE. No próximo ano, ele vai passar
pela etapa de profissionalização, em que a escola ajuda na descoberta da área
de atuação e na inserção no mercado de trabalho.
Balada
O encontro do último sábado foi a terceira edição da
balada na escola. Dessa vez, a festa não foi temática, mas os alunos já tiveram
festa a fantasia, terão uma festa da primavera em setembro e um de Halloween em
outubro. A balada vai das 19h às 22h. Pais e responsáveis ficam de fora.
Somente ex-alunos, amigos e irmãos de alunos são aceitos.
"Sempre juntamos a turma e passeamos para eles
conhecerem os locais e situações reais. Eles começaram a questionar como seria
uma balada e resolvemos fazer uma aqui", afirma Miriam Tramutola,
psicóloga e uma das diretoras da escola.
Marcelo Cleres, de 36 anos, é professor de química,
física, matemática e informática e também o DJ das baladas. "Ficamos
preocupados em manter o estilo bem próximo da realidade. Temos fila na entrada,
lounge e pista", explica.
Cleres ressalta que a balada ajudou a melhorar sua
relação com os alunos. Segundo ele, o convívio melhorou após a iniciativa.
"Se um vínculo afetivo é criado, isso aumenta o respeito e também o
interesse do aluno. Podemos conhecê-los melhor e isso ajuda muito."
A escola oferece ensino regular para os alunos, com
ensino fundamental e médio e OPTE (orientação e preparação tecno
emancipatória). A escola tem alunos com dificuldade de aprendizagem e que
precisam de atenção e metodologia especializada. Os alunos têm todas as
disciplinas do ensino tradicional e são avaliados bimestralmente por meio de
provas. Eles também podem escolher entre as aulas de teatro, música ou artes
plásticas.
A escola tem cerca de 80 alunos e cada sala conta, em
média, com 15 alunos. No período da manhã é oferecido o ensino regular e no
período da tarde é feito o módulo de desenvolvimento, que atende crianças e
jovens que ainda não conseguiram ingressar no mundo da linguagem e precisam de um
apoio especializado.
Já o OPTE se destina a jovens a partir de 14 anos que
necessitam de uma nova modalidade de curso escolar, em que o tempo de
desenvolvimento nos cursos de ensino regular não foram suficientes para atender
as necessidades individuais. "Observamos a necessidade e a capacidade dos
alunos para traçar uma estratégia diferente", diz Miriam. No OPTE, por
exemplo, os jovens não têm matemática e sim, economia e finanaças, em que eles
aprendem na prática, com o uso de operações matemáticas, a utilizar o dinheiro.
Os alunos ainda têm aula de roda, em que eles discutem
temas atuais, com a leitura de jornais e revistas, e oficinas, de escrita e de
matemática, em que os conteúdos são passados de acordo com o ritmo de trabalho
dos alunos, sem que o avanço escolar seja comprometido.
"É um trabalho bastante minucioso e temos que ter
uma comprovação de que o aluno aprendeu. Nas disciplinas de exatas, tento fugir
dos números e mostrar para eles que existem outras formas de enxergar os
conceitos no dia a dia", afirma Cleres.
De Taboão da Serra para SP
Essa foi a primeira balada de Nicolly, já que somente
alunos que tenham a partir de 13 anos de idade podem participar. Ela queria
escutar e dançar as músicas de Gusttavo Lima e Anitta. "Fiquei feliz
porque dancei tudo o que tocou e fiquei até o final. Deu para fazer novos
amigos."
Faladeira e extrovertida, Adilma Oliveira, mãe da menina,
conta que ela é tão animada que interage até demais. "Ela chega aos
lugares e fala com todo mundo. Acho a iniciativa da escola bacana, já que tem
outras crianças que não tem a mesma interação que ela e isso faz com eles
fiquem desinibidos", afirma.
Nicolly chegou a Nane há dois anos depois de não ter uma
experiência muito positiva em outra escola. Segundo Adilma, as colegas a
colocavam em segundo plano por ela ter dificuldades no aprendizado. "Ela
aprende mais na prática e a assimilação acontece com casos mais concretos. Falava
com a direção da escola, mas nada era feito", diz a mãe.
Ela é dedicada aos estudos e acorda às 4h40 para sair do
Taboão da Serra, na região metropolitana de São Paulo, e chegar até a escola
que fica em Moema, na Zona Sul. "É um percurso muito longo, mas ela tem vontade
de ir. Ela é preocupada e sabe das suas responsabilidades", diz Adilma.
Mais amigos
Duda, de 15 anos, também foi em todas as baladas e para
ela o mais importante é ficar perto dos amigos. "Conheci ex-alunos e
passei a conversar com mais pessoas. Agora conheço todo mundo", afirma.
Depois de estudar até o 6º ano do ensino fundamental na
mesma escola, Duda mudou de colégio e chegou na Nane no ano passado. "É
muito bacana o respeito que a escola tem com o ritmo das crianças. Todo o
currículo é adaptado, tanto que ela só tem livro didático para inglês, todo o
resto é feito com apostilas", lembra Monica Moares, mãe da jovem.
Segundo Monica, Duda gosta da balada e sempre fica muito
animada. "A ideia é muito legal. O grupo é heterogêneo e todos se entendem
e se respeitam muito", diz Monica.
Fonte-G1