Análise da compatibilidade da deficiência com o cargo deve ser feita no estágio probatório
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou aos
órgãos do Poder Judiciário que deixem de realizar exames prévios para saber se
a deficiência física de candidatos em concursos públicos é ou não compatível
com o exercício do cargo para o qual eles foram aprovados. A decisão foi tomada
pela maioria dos conselheiros durante o julgamento de dois pedidos de
providências, na 183ª Sessão Ordinária do órgão, realizada na tarde de
terça-feira (25/2), em Brasília/DF. Prevaleceu o voto divergente, apresentado
pelo conselheiro Rubens Curado. Na avaliação dele, a compatibilidade somente
deve ser aferida no decorrer do estágio probatório, ou seja, após a posse do
servidor selecionado.
A questão foi apreciada no julgamento dos Pedidos de
Providência 0005325-97.2011.2.00.0000 e 0002785-76.2011.2.00.0000, movidos pela
Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Mato Grosso do Sul e pelo
Ministério Público Federal. Eles requeriam o afastamento da previsão de
avaliação prévia da deficiência do candidato aprovado em concurso com as
atribuições do cargo constante nos editais, assim como a uniformização de
regras de concurso público para servidores do Judiciário, no sentido de que a
compatibilidade da deficiência do candidato aprovado no certame fosse
verificada exclusivamente durante o estágio probatório.
O conselheiro Emmanoel Campelo, relator dos
procedimentos, votou pela improcedência por entender “não ser irregular nem
ilegal o exame prévio de compatibilidade da deficiência declarada com o cargo
ao qual concorre o candidato”.
Ao apresentar seu voto-vista, o conselheiro Curado
esclareceu que não se discute a realização de perícia por comissão
multidisciplinar para delimitar e determinar a existência e extensão da
deficiência, até para o candidato ter a certeza se deve ou não concorrer às
vagas reservadas às pessoas com deficiência. “O cerne da discussão é outro e
diz respeito ao momento em que deve ser procedida a averiguação da
compatibilidade entre a deficiência do candidato aprovado e as atribuições a
serem por ele exercidas no cargo”, explicou.
Na avaliação de Curado, garantir à pessoa com deficiência
o direito à avaliação da compatibilidade entre as atribuições do cargo e a sua
deficiência durante o estágio probatório é a “solução que mais se coaduna com a
integração social desejada pela sociedade democrática”, a teor do que dispõe a
Constituição Federal e a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência, ratificada pelo Brasil e com força de emenda constitucional.
Curado também lembrou que a regra encontra-se descrita no artigo 43 do Decreto
n. 3.298, de 20/12/1999, que dispõe sobre a Política Nacional para a Integração
da Pessoa Portadora de Deficiência. O próprio CNJ também adotou a regra na
Resolução n. 75/2009, que trata dos concursos públicos para ingresso na
magistratura.
“São públicos e notórios casos de pessoas com deficiência
detentoras de talentos excepcionais a superar eventuais limitações físicas. São
igualmente públicos e notórios pareceres prévios apressados, e por vezes
injustos, acerca da ‘compatibilidade’ de tais deficiências com as atividades do
cargo”, afirmou o conselheiro, em seu voto.
Curado destacou não vislumbrar uma única hipótese em que
a mais grave das deficiências possa ser considerada incompatível com as
atividades de um cargo de servidor do Judiciário. “Ao que me parece, toda e
qualquer dificuldade teórica de compatibilidade pode ser superada no curso do
estágio probatório, a depender do talento, da operosidade, das habilidades e
das atitudes do candidato”. E ressaltou: “parece-me pouco democrático, quiçá
discriminatório, diante do contexto normativo mencionado e do aludido dever de
integração social, ceifar um candidato com deficiência, já aprovado nas provas
de conhecimento, do direito de demonstrar, na prática do dia a dia do estágio
probatório, não apenas a compatibilidade da deficiência com as atribuições do
cargo, mas que detém talento, habilidades e atitudes suficientes para,
eventualmente, suprir e superar a sua deficiência”.
Giselle Souza
Agência CNJ de Notícias
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