A aparência frágil do consultor motivacional Alexandre Ferreira Abade,
que por ter "ossos de vidro" vive sobre uma cadeira de rodas motorizada e
tem mobilidade mínima nos braços e pernas, esconde uma personalidade
agitada e persistente: o brasiliense tem duas graduações, uma pós,
vários cursos profissionalizantes e uma agenda cheia de palestras a dar.
O primeiro contato com letras e números só pôde ocorrer aos 17 anos,
depois de ele superar a baixa expectativa de vida dada pelos médicos por
causa das mais de 300 fraturas sofridas na infância e adolescência.
Duas décadas depois, o homem segue recusando a imagem de "vítima" e se
prepara para lançar o segundo livro sobre sua trajetória.
O diagnóstico de osteogênese imperfeita só veio aos 2 anos. "Tinha duas
fraturas [nas pernas, desde o nascimento], mas os médicos não sabiam,
só souberam em uma consulta que tive e o médico notou uma pequena
diferença entre uma perna e outra e assim foram investigar a causa.
Qualquer tipo de movimento [provocava fratura]. Eu não poderia sair para
outros lugares de ônibus ou carro, pois os movimentos já ocasionavam
fraturas, meus ossos eram muito frágeis, se quebravam facilmente, eram
como vidro", lembra.
A família tentou lidar com a situação com naturalidade, mas acatou as
recomendações dos profissionais que passaram a acompanhar Abade. Ele
nunca pôde experimentar tentar andar, e os médicos achavam que ele
viveria no máximo até o início da adolescência. O consultor
motivacional, que tem quatro irmãos, afirma nunca ter questionado as
razões de ser o único a ter as limitações.
"Segundo previsões médicas eu viveria até os 12 anos de idade. Devido
as minhas constantes fraturas, eu corria o risco de quebrar a coluna e o
medo dos médicos era esse. Mas após os 12 anos, contrariando suas
previsões e principalmente com a fé que os meus pais tiveram, esse
diagnóstico foi mudado, eu superei mais essa previsão e fui vivendo dia
após dia e cada vez mais, com a ajuda de Deus, superando e vivenciando
cada momento, acreditando que Deus me ajudaria até na cura das minhas
fraturas, como de fato aconteceu", afirma. "Dos 17 anos até hoje eu não
tive mais nenhuma fratura e nenhum problema de saúde, sigo minha vida
normalmente."
Prestes a completar a maioridade, Abade decidiu experimentar o que já
era parte da rotina de todo mundo: estudos e trabalho. Ele foi
matriculado no Centro de Ensino Especial de Sobradinho e depois passou
para uma escola regular. Colegas colocavam folhas de carbono sob os
papéis dos cadernos e assim lhe garantiam cópias das anotações. As
provas eram feitas em salas de uso individual, com a ajuda dos
professores.
A dedicação do consultor motivacional o ajudou inclusive a combater
preconceitos. "Tinha colega que não se aproximava de mim porque
imaginava que eu era uma pessoa que não poderia sair, me divertir, ou
seja, que eu era uma pessoa que não teria muita alegria para fazer
amizade. Mas, com o passar do tempo, esses colegas me viam em festas da
escola, eventos, e então logo mudaram a forma de pensar e viram que eu
era capaz, que independente das minhas deficiências eu posso ter uma
vida normal, e foram aprendendo através de mim que outras pessoas com
deficiência são tão capazes quanto."
Abade passou então a dar palestras contando a própria história. Ele
também fez diversos cursos profissionalizantes e se formou em gestão em
marketing e gestão em administração de empresas. Depois, o homem fez
pós-graduação em recursos humanos. O consultor motivacional diz que os
estudos o ajudaram a se aperfeiçoar na área e a prosseguir com os
projetos de palestras e educação inclusiva.
Visto como exemplo para colegas e professores, Abade percebeu como
conseguia mudar os conceitos dos outros sobre deficiência e escreveu o
primeiro livro há quatro anos. Ele trabalha atualmente em uma nova obra e
conta com a ajuda da amiga Sarah Sena.
"O tema é um pouco da minha história, das conquistas atuais. E falamos
também sobre pessoas com deficiência, que independente das limitações
todos somos capazes de estar inseridos no mercado de trabalho, escolas,
faculdades e principalmente temos o direito de ter o nosso lazer e os
nosso direito garantidos", explica.
Futuro
O consultor motivacional diz sonhar em crescer profissionalmente por
meio dos projetos sobre educação e inclusão de pessoas com deficiência.
"[Quero] Cada vez mais contribuir para que a inclusão não seja apenas
uma teoria, mas uma prática constante na vida da nossa sociedade, que
precisa muito abraçar essa causa e ter uma nova visão de pessoas com
algumas limitações e não só pessoas com deficiência, mas também pessoas
idosas, que também precisam ter o seu direito garantido e principalmente
o seu respeito e atenção merecidamente, porque um dia todos nós vamos
ficar velhos, um dia podemos ficar deficientes."
Abade, que recentemente ganhou a cadeira motorizada, diz ter ganhado
com o equipamento maior independência. Entre os próximos objetivos estão
deixar a casa da mãe e formar a própria família.
O
brasiliense Alexandre Abade, que tem 'ossos de vidro',
junto com amigos (Foto: Alexandre Abade/Arquivo Pessoal)
"Eu me considero uma pessoa normal, mesmo com minha deficiência física.
Tive relacionamentos amorosos e decepções como qualquer outra pessoa,
mas, como um homem de fé e que sempre acredita que tudo é possível
quando buscamos a Deus, eu sei também que realizarei a mais esse sonho
que é constituir família."
"Não me vejo incapaz, sei que sou diferente, mas com as minhas
diferenças faço a diferença", completa o homem. "Com toda a minha
trajetória passada tive meus momentos para me preparar para romper todas
os paradigmas e preconceitos, encarando a vida de frente e aceitando-a
como eu sou, e em nenhum momento tive questionamento por causa das
minhas limitações. Pelo contrário, busquei na minha deficiência um lado
positivo em viver, estudar, trabalhar e tenho um bom relacionamento com
as pessoas que passam em minha vida."
Fonte-G1
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