A Comissão de Direitos Humanos e Legislação
Participativa (CDH) realizou debate, nesta segunda-feira (29), sobre a
aplicabilidade da Lei Brasileira de Inclusão, também conhecida como Estatuto da
Pessoa com Deficiência. Na audiência pública, predominou entre os expositores a
visão de que a lei foi um marco no sentido da inclusão e da ampla cidadania das
pessoas com deficiência, mas houve também críticas a pontos específicos do
texto e sugestões de mudanças.
As locadoras de veículos rejeitam, por
exemplo, a obrigação de que, para cada 20 veículos da frota, um seja destinado
para o uso de pessoas com deficiência. A Associação Brasileira da indústria,
Comércio e Serviços de Tecnologia Assistiva (Abridef), sugeriu correção em
aspectos técnicos relativos às adaptações em veículos para esse grupo de
usuários. Além disso, defendeu a concessão de novos subsídios para serviços
dentro dessa modalidade.
O presidente da CDH, Paulo Paim (PT-RS),
adiantou que está abrindo diálogo para avaliar as adequações que sejam
necessárias ao texto da lei. Autor do projeto do estatuto e também autor do
requerimento de audiência, Paim alertou, contudo, que os ajustes não podem
comprometer as conquistas asseguradas. O texto foi sancionado em julho do
ano passado, passando a vigorar em janeiro deste ano.
- Nunca tivemos a pretensão de elaborar um instrumento
irretocável, mas o estatuto vai além de um conjunto de artigos. O que o torna
ainda mais especial é o debate político que provocou e ainda provoca, mostrando
que ainda pode ser aperfeiçoado – comentou Paim.
Ficou acertado que as sugestões para ajustes
no texto da Lei de Inclusão devem ser encaminhadas formalmente ao Conselho
Nacional da Pessoa com Deficiência (Conade), onde serão pré-avaliadas e
consolidadas em um único documento. Depois, essas contribuições serão
encaminhadas à CDH, como subsídio a um projeto de lei para atualização do
estatuto. A entrega deve ocorrer em 6 de julho, durante seminário no Auditório
Petrônio Portela, em celebração ao primeiro ano da sanção da lei.
Carro acessível
A diretora da Abridef, Mônica Cavenaghi,
observou que, na forma atual da lei (artigo 52), as locadoras de veículos estão
obrigadas a ofertar veículos adaptados apenas para as pessoas que dirigem os
veículos. Salientou, porém, que é necessário que as empresas providenciem
carros para as pessoas que não dirigem, mas que precisam ser transportadas em
sua própria cadeira de rodas no interior do veículo. Citou, como exemplo, a
condição da deputada Mara Gabrilli (PSDB-SP), que é tetraplégica.
Com relação à frota de táxis, recomendou a
regulamentação do padrão de veículo adaptado, evitando a oferta de automóveis
fora de padrões de segurança. Também pediu apoio para a concessão de subsídios
para adaptações veiculares que não se restrinjam às modificações feitas pelas
próprias montadoras, como câmbio automático e outros itens mais básicos. Essa
previsão estava no texto do estatuto, mas foi vetada pela presidente Dilma
Rousseff.
- Essa isenção atenderia parcela da
população que tem deficiências mais severas e que, hoje, depois e comprar seu
carro, ainda tem de pagar pelas adaptações – disse.
Livre mercado
Houve também quem defendesse a completa
supressão do artigo que obriga as locadoras a manterem em suas frotas veículos
adaptados às necessidades de pessoas com deficiência. Essa foi a posição do
presidente da Federação das Empresas de Transporte de Passageiros dos Estados
do Paraná e Santa Catarina, Felipe Busnardo Gulin. Segundo ele, a medida é
inconstitucional, argumento que já motivou a Confederação Nacional do Transporte
a mover ação junto ao Supremo Tribunal Federal para derrubar o artigo.
- Trata-se de uma violação da liberdade de
iniciativa das locadoras de veículo. Como não há oferta de veículo para todo o
tipo de necessidade, as locadoras precisariam exercer atividade industrial para
cumprir a legislação – argumentou Gulin.
Roberto Marconne Celestino de Souza, da
área jurídica e de fiscalização do Departamento Nacional de Trânsito
(Denatran), embora apoiando os princípios gerais do estatuto, condenou a
descrição detalhada que o texto hoje traz em relação aos itens requeridos nas
adaptações veiculares, a exemplo de câmbio automático, tipo de freio e vidros
elétricos. Segundo ele, essas exigências devem ser feitas não em lei, mas por
meio de regulamentações administrativas, que nesse caso caberia o próprio
Denatran.
- Expor equipamentos obrigatórios em
dispositivo legal pode acarretar engessamento da norma. Diante dos grandes
avanços tecnológicos que temos, isso de fato traz um engessamento – justificou.
Sem retrocessos
O presidente do Conade, Flávio Henrique de
Souza, adiantou que o órgão está disposto a debater ajustes no texto da Lei de
Inclusão que sejam reconhecidos como importantes. Porém, adiantou que o órgão
não vai abri mão de direitos conquistados em prol da pessoa com deficiência.
Observou que a norma tramitou por duas décadas, resultando de debates com todos
os segmentos sociais que se mobilizaram para participar.
- Uma coisa é fazer ajustes técnicos e
corrigir distorções, mas a retirada de direitos a Conade não vai aceitar e
concordar em momento algum – garantiu.
A respeito da ação de inconstitucionalidade
proposta pela CNT, baseada o argumento de que o estatuto viola o princípio
constitucional da livre iniciativa, o procurador Felipe Fritz Braga, do Ministério
Público Federal, lembrou que o ministro do STF Edson Fachin já negou uma
liminar pedida pelos autores. A seu ver, o mérito da ação também não deve ser
acolhido pela Corte. Na sua avaliação, os autores perderam o “bonde da
história”, não compreendendo o conceito de função social da propriedade.
O procurador também criticou os vetos da
presidente Dilma ao estatuto, no total de oito. Criticou sobretudo o corte de
dispositivo que garantia cota especifica em favor das pessoas com deficiência
em instituições de ensino – inclusive profissionalizante – e empresas. A seu
ver, faltou a continuidade da mobilização social depois da aprovação final do
projeto no Senado.
Participou também do debate Aline Sá
Cavalcante, assessora do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, que
detalhou programas de apoio e recursos em favor do desenvolvimento de pesquisas
e produtos de tecnologia assistiva.
Fonte: Agência Senado
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