segunda-feira, 16 de maio de 2016

Jovens e adultos surdos aprendem a tocar instrumentos de percussão

Sentir a música em vez de ouvi-la. Deixar as batidas dos instrumentos adentrarem no corpo, contrariando a ordem natural dos sentidos. Mesmo sem pronunciar uma só palavra, um seleto time de jovens e adultos do Recife se esforça para transformar o mundo a sua volta. É garra e superação. O grupo Batuqueiros do Silêncio chega ao sexto ano de vida, promovendo a inclusão social de pessoas surdas, a maioria oriunda de comunidades carentes da cidade.
Com cores, luzes e símbolos, eles aprendem a tocar instrumentos de percussão e, assim, seguem a desafiar os próprios limites. A comunicação se mostra a cada batida. Sem sede própria e recursos financeiros, a luta agora é para manter a iniciativa pioneira.
“A música promove uma linguagem universal. Quando aprendem a dominá-la, os surdos desenvolvem sensações, vibrações e um sentimento que os impulsiona”, explicou o professor e líder do projeto Irton Silva. Para ele, uma das preocupações é pela essência cultural da terra, priorizando ritmos como o maracatu.
Método
A metodologia tem como base uma mesa de lâmpadas. Os alunos acompanham as orientações. Duas vezes por semana, o grupo formado por cerca de dez meninos e meninas marca presença nos ensaios. “Quando temos apresentações marcadas o ritmo aumenta. São muito aplicados”, diz o mestre. Após enfrentar dificuldades, os Batuqueiros agora ocupam uma simpática casa na movimentada avenida Norte, no bairro de Casa Amarela.
Os jovens, em diferentes níveis de surdez, não pagam para participar. É o caso de Karina Guimarães, 30, que se juntou aos músicos há dois anos. “Sempre me foi imposto que surdo não poderia participar disso ou daquilo. Com a música, consegui escrever uma nova história”. Ela trabalha como digitadora em uma repartição pública e, nas horas vagas, dedica o tempo ao toque das alfaias.
Na mes­ma sintonia está o estudante Caio Pessoa, 21. “Às vezes me perguntam que graça tem se não posso ouvir. Respondo sempre que a magia está na forma que posso imaginar”, revelou com altivez, reforçando que a única barreira está no preconceito.

Apoio
Sem dispor de domínio na Língua Brasileira de Sinais (Libras), Irton Silva conta com apoio de amigos. É o caso da intérprete Jaqueline Martins, que voluntariamente participa da atividade e acaba dando uma força para a equipe da Folha de Pernambuco conhecer melhor os diferentes relatos. “Eles sentem a música com o coração”, ressaltou.
Para fazê-los entender ritmos e diferentes cadências, o professor desenvolveu uma peça impar, batizada de metrônomo visual. “Cada cor que acende representa uma intensidade diferente”, esclareceu. Pelo cronograma, a luz branca indica uma batida forte, a verde mais fraca. Já a vermelha pode ser uma pausa na canção. Quando as amarelas despontam, o aviso é para dupla batida. “Também complemento com gestos, o que chamo de alfabeto musilibras”, comentou.

Ganhos
Para a psicóloga comportamental Ana Rique, o trabalho desenvolvido com os surdos pode proporcionar ganhos em diferentes esferas. “Sentem-se mais prontos para a vida, o que pode refletir em mais confiança para galgar um emprego, se relacionar com a família ou, até mesmo, obter êxito na trilha amorosa. A deficiência acaba ficando em segundo plano”, afirmou.
A visão benéfica também é reforçada pela fonoaudióloga Katarina Souto. “Para eles, a cadência permite conhecer uma melodia não audível, percebê-la, compreendê-la e respondê-la. As ondas sonoras acabam alcançadas pela pele e pelos ossos. Dançam, me­xem-se e interagem”.

Fonte-Folha de Pernambuco

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