Carlos Pereira, empreender social
criador do Livox, Aline Costa Pereira, sua esposa e a filha, Clara, no
parque temático Magic Kingdom, em Orlando, na Florida (EUA)
Vítima de paralisia cerebral ao nascer, Clara, 9, precisou esperar cerca
de uma hora dentro de um avião para conseguir desembarcar no Brasil
após nove horas de voo desde Orlando, nos Estados Unidos, onde mora com a
família.
O episódio aconteceu na manhã desta quinta-feira (9), quando seu pai,
Carlos Pereira, pediu para a comissária de bordo que agilizasse a
entrega do equipamento especial com o qual ela se locomove, que conta
com suporte para o corpo, no portão de desembarque no Aeroporto
Internacional do Recife.
Durante o embarque em Orlando, Carlos despachara o item, que recebeu a
etiqueta "gate delivery" (entrega no portão), o que deveria garantir que
o objeto fosse restituído à família diretamente no portão.
Em um desabafo emocionado em rede social,
Carlos, que é o vencedor do Prêmio Empreendedor Social 2016,
relatou as dificuldades para fazer valer o direito de sua filha, para
quem desenvolveu um aplicativo de comunicação alternativa que é
considerado o melhor mundo pela ONU.
Em entrevista à
Folha, o analista de sistemas contou também os
detalhes da longa espera. Segundo ele, após o pedido da cadeira de
rodas, a comissária respondeu com um lacônico: "Vou ver".
O pai de Clara disse ter ficado surpreso com a incerteza e, ao
questionar, a réplica da funcionária da companhia Azul Linhas Aéreas foi
um prenúncio da maratona que enfrentaria em solo brasileiro: "Às vezes,
a Receita [Federal] embaça", teria dito a comissária.
No momento do desembarque, a cadeira especial de Clara não estava no
portão. Uma outra foi oferecida, mas Carlos se recusou a sair da
aeronave, pois era um modelo padrão, destinada a adultos, o que colocava
em risco sua filha. "Era uma cadeira sem estrutura."
Carlos, a mulher, Aline, e a filha ficaram à espera no avião durante
cerca de uma hora, junto com os tripulantes e a equipe de limpeza. Com o
ar-condicionado desligado e uma temperatura de 29°C entre 8h e 9h no
Recife, o calor na cabine foi ficando insuportável, causando
desconfortos à criança. "Aline ficava abanando Clara."
De acordo com Carlos, o funcionário de solo relatou que a Receita
Federal precisava inspecionar a cadeira embarcada nos EUA e, por isso,
ela não tinha sido liberada.
No entanto, o pai questionava o fato de, mesmo passando pelo controle, a
cadeira não poder chegar ao finger, como seria o esperado e previsto
por uma regra da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), que garante
acessibilidade às pessoas com deficiência.
Um funcionário ficava entre idas e vindas à Receita Federal para liberação, segundo Carlos, sem sucesso.
A assessoria da Receita informou que o fiscal responsável pelo voo foi
contatado duas vezes. A primeira quando a equipe da Azul ligou para
informar que havia um passageiro se recusando a descer da aeronave na
cadeira da Infraero e, a segunda, para autorizar um funcionário buscar a
cadeira de Clara na esteira.
O resgate do equipamento, no entanto, precisou ser feito pelo próprio
pai. Na companhia de um funcionário, Carlos passou pelo controle de
passaporte e foi até a esteira buscar a cadeira e então voltar ao
desembarque para finalmente retirar a filha da aeronave.
Por meio de nota, a Azul informou que "que seguiu a orientação das
autoridades aeroportuárias e que prestou toda assistência necessária e
possível com objetivo de agilizar a restituição da cadeira especial no
desembarque".
A companhia, no entanto, não respondeu por que a cadeira não foi enviada
diretamente para o portão de desembarque se estava assim sinalizada
desde a origem, nem se o funcionário que fez a ponte entre Carlos e a
Receita é da companhia ou da Infraero.
NORMAS
Para a deputada federal Mara Gabrilli (PSDB-SP), relatora da Lei
Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, a regra da Anac é
clara. "A partir do momento que a pessoa chegou no portão de embarque na
própria cadeira, ela tem que voltar para o portão [no momento do
desembarque]."
Apesar da norma, ela, que também utiliza uma cadeira especial por ser
tetraplégica, tem diversas histórias sobre a demora do retorno do
equipamento ao fim de viagens aéreas. "Em Miami, uma vez, a funcionária
do aeroporto mentiu para mim dizendo que minha cadeira estava na porta
do finger", relata.
Segundo Mara, a demora muitas vezes é justificada por controles de segurança, especialmente nos Estados Unidos e na Europa.
Ao avaliar o episódio de Clara, ela vê uma falha da Azul. "Me parece
que, nesse caso, foi um erro da companhia que, ao invés de levar para o
portão, encaminhou para a esteira [de bagagens]."
Carlos fez um segundo desabafo após chegar no hotel. "Eu não fiz isso
para aparecer nem para criar confusão. Isso é um direito da pessoa com
deficiência, ter sua cadeira entregue na porta do avião e devolvida na
porta do avião."
Fonte-Folha de São Paulo. Acesse e assista vídeo
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