terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

A Banda,por Manuela Dantas


Por Manuela Dantas, Blog de Jamildo
“...Estava à toa na vida
O meu amor me chamou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor
A minha gente sofrida
Despediu-se da dor
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor
O velho fraco se esqueceu do cansaço e pensou
Que ainda era moço pra sair no terraço e dançou
A moça feia debruçou na janela
Pensando que a banda tocava pra ela
A marcha alegre se espalhou na avenida e insistiu
A lua cheia que vivia escondida surgiu
Minha cidade toda se enfeitou
Pra ver a banda passar cantando coisas de amor...”


(Trecho da música A Banda, de Chico Buarque)

O carnaval chegou como a banda de Chico Buarque e me arrastou com a sua alegria, como sempre tenta fazer...  Poucas vezes não consegui seguir na banda com sua fugaz alegria, mas sempre tentei e continuo tentando...

Ademais, sempre considerei o carnaval a festa mais democrática existente, já que reúne na mesma rua pobres e ricos, diversos tons de pele, diversas religiões, diversas crenças, diversas línguas, diversas alegrias...

Quando há quase três anos passei pelo acidente que me deixou paraplégica, tinha acabado de acontecer o carnaval de 2010, que foi memorável, principalmente por ter me curado de um inicio de depressão que uma decepção amorosa tinha me causado.

Sou grata ao carnaval, muito grata... Por me permitir sempre descobrir que a vida continua e que continua linda, a despeito de qualquer dificuldade física, mental, sentimental...

Cheguei a pensar, depois do acidente, que não poderia mais participar dessa festa popular que amo e que faço questão de ir a caráter, buscando minhas fantasias, preparando os adereços e me entregando de corpo, alma e coração.

Confesso, sem receio de parecer superficial, que depois do acidente sonhei muito com o carnaval, pulando um belo frevo, dançando ciranda, batucando com os Maracatus, subindo as ladeiras de Olinda... Quando acordava e me dava conta que estava numa cadeira de rodas, ficava muito triste por pensar que aquela festa que eu tanto gostava não era mais possível para mim... Que bom que eu estava errada!

Pois bem, armada com as minhas flores e minhas fantasias fui para o Galo da Madrugada e para Olinda, fiquei nos camarotes da acessibilidade, os quais estavam muito bem organizados, claro que o melhor seria que todos os camarotes em Pernambuco fossem acessíveis, que as calçadas fossem adequadas, que as praças fossem acessíveis, mas tudo tem seu tempo e por hora é bem importante existirem esses camarotes para permitirem que pessoas como eu e como 27% da população pernambucana, que possuem algum tipo de deficiência, continuem participando da nossa mais tradicional festa popular.

Com efeito, além de um camarote com as condições adequadas de acessibilidade em termos de banheiros adaptados, rampas adequadas, tradutor de libras e áudiodescrição, também se fazem necessário prever os acessos a esses eventos, as chamadas rotas acessíveis, e preparar adequadamente os colaboradores que irão assessorar as pessoas com deficiência e para falar a verdade nua e crua, precisamos urgentemente de um trabalho de educação da nossa população em cidadania, uma cultura cidadã, para todos entenderem e verem além das deficiências.

Lembro que quando participei do meu primeiro carnaval, após o acidente, estava acompanhada de mais duas pessoas e tentando passar pelas ruas de Bezerros quando uma mulher perguntou para mim se eu estava doida em querer participar do carnaval naquele estado... Mas eu não estava doente, não estava debilitada, estava “apenas” sem conseguir andar e tinha uma cadeira de rodas para me ajudar e, sobretudo amigos para brincarmos juntos.

Chocou-me também ler em 12/02/13 o artigo da Noelia Brito no Blog de Jamildo que relata como um cadeirante foi impedido de passar pelo camarote da Prefeitura do Recife para conseguir ter acesso ao camarote da acessibilidade no Recife Antigo, relata além das injustiças, a falta de respeito ao cidadão e como a sociedade está despreparado para lidar com pessoas com deficiência, que querem simplesmente VIVER...

Já vivi várias situações como a narrada por ela, como, por exemplo, na Fliporto em 2012, em que o estacionamento "teoricamente" era só para integrantes do governo, enquanto que o decreto federal 5.296 prevê que 2% das vagas são para pessoas com deficiência, enfim depois de muita confusão e um telefonema para um dos organizadores do evento, a entrada foi liberada, mas o meu lazer tão esperado na Fliporto já estava sacrificado pela dor em não conseguir ter acesso naturalmente ao evento e principalmente por não ver a nossa legislação tendo eficácia.

A esse evento se somam o Vivo Open Air, o Réveillon no Clube Cabanga e muitos outros que não dispuseram a mínima condição de acessibilidade a pessoas com deficiência e que infelizmente não pude participar com minha família e amigos.
Enfim, mantenho a esperança que aconteçam mais festas populares e que venham mais eventos ao Recife e a Pernambuco e que eles sejam cada vez mais democráticos e mais acessíveis para que pessoas, que tive o prazer de conhecer, como o Carlos, a Sofia, o Magno, o Paulo, o Edmilson, o Bruno, a Vivian, o Geziel continuem a viver a magia da nossa cultura e possam permanecer sonhando, cantando e VIVENDO.

Por fim, findo com a marchinha Último Regresso de Getúlio Cavalcanti:

“... Não deixem não, que o bloco campeão
guarde no peito a dor de não cantar.
Um bloco a mais, é um sonho que se faz
o pastoril da vida singular.
É lindo ver o dia amanhecer,
ouvir ao longe  pastorinhas mil.
Dizendo bem que O RECIFE TEM
O CARNAVAL MELHOR DO MEU BRASIL.”

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